quarta-feira, 15 de abril de 2015
O amor é cego, ou você que é?
Dizem que o amor é cego, mas na verdade nós que somos. É como se nos primeiros meses de relacionamento uma venda opaca fosse posta sobre os nossos olhos e ficássemos cegos e surdos a tudo o que a nossa paixão faça de errado, tudo aquilo que quebre um pouco essa ideia de amor perfeito que tão cuidadosamente criamos e alimentamos.
Eu ia seguindo a dança, o ritmo frenético da doce música que os predadores cantam e tocam para atrair a presa, e teria caído na rede dele, caso não tivesse recebido tantos alertas de todas as pessoas com as quais se preocupavam e me amavam. Não que eu mesma não percebesse as coisas erradas, mas estava tão envolvida, tão presa em todos aqueles sentimentos novos e excitantes que eu nunca havia sentido, tão cega por todo aquele brilho, que ignorei todos os sinais amarelos e vermelhos, todos os avisos, todas as hesitações, todas as vozes de alerta que o meu instinto me berrava “Nem tudo o que reluz é ouro”. Achava que era só o medo do desconhecido, que sussurra no seu ouvido antes de você enfrentar uma experiência nova. E nas palavras do predador “você não pode deixar essa oportunidade passar porque tem medo”.
Eu teria continuado. Acho que não teria forças para nadar contra a correnteza que ele me arrastava. Ficaria tal qual uma mosca estúpida que não percebeu o quão perto voava perto da teia, como uma mariposa que achava que podia voar perto da luz, e não morrer ao se chocar contra o vidro e o calor.
Se eu não tivesse recebido um tapa na cara tão forte, uma arrancada brusca e rápida da venda que me cegava, talvez hoje a minha vida estivesse destruída. Era como se a própria vida dissesse “OLHA O QUE VOCÊ VAI FAZER” e me forçava a olhar. E de repente, me dei conta pela primeira vez do que estava fazendo comigo. O que ele fazia comigo. Como ele fazia com que eu me sentisse, e como eu me curvava, sem perceber. O que vi foi chocante, degradante, me revirou o estômago e eu quis chorar. Como eu tinha me colocado naquela situação? Como tinha permitido ser usada daquela forma? Ser tratada como um mero objeto? Eu, que sempre procurei me dar valor, ser tão desvalorizada e rebaixada?
Talvez, se eu tivesse continuado, eu estivesse perdida de uma forma que já não fosse possível achar o caminho de volta. Quando paro para pensar, percebo que talvez eu tivesse ficado sozinha, refém do predador. Presa em um eterno conflito interno, pois um lado meu sabia que tinha algo errado. No entanto, o outro achava por bem ignorar, ser complacente, perdoar, porque amar é perdoar, não é isso o que dizem?
“É muito comum que as mulheres acreditem que é um sinal de compromisso, uma expressão de amor, suportar o maltrato, a crueldade, perdoar e esquecer. Na verdade, quando nós amamos direito, nós sabemos que a resposta saudável e amável a esse tipo de abuso é nos retiramos desse caminho de dor”. (tradução porca de uma frase da Bell Hooks).
No início, confesso que me retirei mais pelos outros. Como disse antes, eu não teria forças para sair sozinha, precisava da ajuda dos demais, e aqueles que se preocupavam me pegaram pelos braços e me tiraram da água turva. Depois disso foi ficando mais fácil. Restabeleci a visão perdida, pude ver a incoerência das palavras do leão e pude tirar o piche das minhas asas, que tão sofregamente tentavam alçar vôo aos primeiros sinais de abuso, mas que se encontraram sem forças até mesmo para planar. Voei para longe, ignorei as tentações, e por mais que vá contra a minha natureza, não posso me sentir mal pelo tratamento que dispenso a ele. Afinal de contas, é a minha resposta saudável a esse tipo de abuso. É a resposta amável para comigo mesma, porque esse não é o tipo de amor que eu acho que mereço.
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